sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Movimento Amigos da Ilha do Fogo constrói Comitê Amplo de Lutas

A Ilha do Fogo, situada entre as cidades de Juazeiro e Petrolina passou a ser administrada pelo Exército brasileiro desde Setembro de 2012, por decisão judicial. A partir de então, o acesso dos banhistas ficou proibido e um grupo de estudantes, artistas e demais segmentos da sociedade organizaram o Movimento Amigos da Ilha do Fogo para defender que a visitação do espaço seja mantida.

Na última sexta-feira (06/12), um Ato Público foi realizado na Orla de Juazeiro para chamar atenção da sociedade e das autoridades locais para o livre acesso à Ilha. No evento foi criado um Comitê Amplo de Lutas para ampliar e definir as atividades do grupo. Para explicar um pouco mais das atividades construídas pelo coletivo e seus objetivos, conversamos com Stefan Mantu, um aposentado paulista que sensibilizado com a causa, passou alguns meses na região do Vale do São Francisco engajado no movimento.


1) Como surgiu o movimento Amigos da Ilha do fogo?

Não estava na região nesse período (metade desse ano) mas acompanhei de São Paulo esse processo. O Coletivo de Luta dos Amigos da Ilha, criado em sua grande maioria por frequentadores da Ilha surge como uma importantíssima reação à ameaça de invasão e fechamento de Ilha do Fogo.

2) O movimento Amigos da Ilha continua construindo atividades contra a ocupação do Exército à Ilha do Fogo. Quais foram os avanços até agora?

Considero que a compreensão das verdadeiras razões para a absurda invasão da Ilha do Fogo à partir das denúncias da dep. fed. Perpétua Almeida PCdoB do Acre e dos protestos da principal entidade nacional de arquitetura e Urbanismo, o CREA, nos demos por conta de que o acordo da CODEVASF
com o exército norteamericano (USACE) foi feito à revelia das autoridades nacionais responsáveis pela autorização da presença de tropas estrangeiras em nosso país. Para se lutar com possibilidades de vitória é fundamental se compreender o quadro em que a luta se dá.

3) As pessoas que defendem a administração do exército alegam o uso de drogas no local. O que o Movimento Amigos da Ilha pensa a respeito?

Todos sabemos que a Ilha do Fogo sempre foi um local privilegiado para o consumo de drogas em função do abandono em que - principalmente de nossa juventude - as autoridades responsáveis por sua administração a largaram. Esse argumento absurdo tinha como objetivo - e de certa forma inicialmente conseguiu - estigmatizar a todos que lutavam contra a invasão da Ilha. Felizmente e com muito trabalho e paciência fomos desarmando essa verdadeira ratoeira. A invasão da Ilha resolveu o problema das drogas nas duas cidades? Claro que não! Droga é uma questão de saúde pública e como tal deve ser tratada.

4) Vocês defendem que as prefeituras de Juazeiro e Petrolina assumam a administração da ilha, no que diz respeito a segurança, limpeza e estruturação. Como seria essa divisão?

Essa não é uma questão que cabe ao Coletivo solucionar. Apenas apontamos as responsabilidades sobre a Ilha. Existe um projeto do Museu do Ribeirinho elaborado pela Univasf que consideramos extremamente importante e deve ser realizado na própria Ilha.

5) Na ultima atividade o grupo parou a orla de Juazeiro para chamar a atenção da sociedade. Qual a avaliação desta ação? Ela alcançou seus objetivos?

Não paramos a Orla de Juazeiro, o trânsito foi desviado sem provocar transtornos à população. Eu considero essa atividade do Ato Público extremamente importante para que as duas cidades tomem consciência das questões que estão envolvidas nessa luta. Como consequência desse Ato, nesse sábado criamos um Comitê de Luta extremamente importante contando com a participação de sindicatos, entidades de defesa do S. Francisco, etc. A nossa organização atinge dessa forma um patamar bem mais avançado.

6) Quais serão os próximos passos do movimento para tentar permitir o acesso do povo à Ilha?

O principal passo foi a criação do Comitê Amplo de Luta. As ações futuras vão ser discutidas e planejadas nesse organismo recém criado.

7) Caso o acesso do povo à Ilha seja devolvido, o movimento pretende continuar de alguma forma?

Importante considerar que o movimento tem 3 reivindicações e o acesso à Ilha é somente uma delas. O direito ao trabalho dos pescadores que com suas famílias sobrevivem há mais de 30 anos da pesca e estão sendo expulsos da Ilha é outra fundamental bandeira de luta nossa, aliás, a 1a. A suspensão imediata do contrato entre a Codevasf e o exército norteamericano para uma profunda análise de seu conteúdo e a imediata retirada dos soldados norteamericanos da região completam atualmente nossas reivindicações.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012

Abertura de seminário na UNEB marcou o dia de luta pela democratização da comunicação


Comunicação pra quê? Este é o nome do seminário iniciado na tarde de ontem (18), no Auditório Antônio Carlos Magalhães, da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), em Juazeiro. Além de batizar o evento, o questionamento norteou as discussões acerca da comunicação no Sertão do São Francisco. A data do evento marcou o dia internacional da luta pela democratização da comunicação, em que debates semelhantes aconteceram em diversos locais do mundo.
Além da democratização da comunicação, temas como comunicação comunitária e popular, direitos humanos, conselhos de comunicação, tecnologia e participação social foram relacionadas ao debate. Para a coordenadora do evento, a professora Gislene Moreira, a participação do indivíduo na produção da comunicação é fundamental para seu desenvolvimento. “A gente faz comunicação para o desenvolvimento das nossas vidas”, avaliou.
Na conferência de abertura, a Diretora do DCH III, Aurilene Rodrigues enfatizou a importância do espaço de debate e o comprometimento da organização para a realização do evento. A jornalista do Fórum de Comunicação do Sertão do São Francisco Érica Daiane iniciou as discussões fazendo um resgate histórico da evolução da comunicação no Vale do São Francisco, ressaltando a importância de pessoas como Dom José Rodrigues neste processo.
A professora da Universidade Metodista de São Paulo Cicília Peruzzo trouxe à discussão a definição ideal da comunicação atual. “É importante a gente conceber a comunicação como um processo mais amplo de organização social. Então, nesse modelo participativo, a luta pelo direito à comunicação se torna mais explicita”, pontuou Cicília.
Já o radialista da região sisaleira da Bahia Edisvânio Nascimento discutiu o papel fiscalizador da comunicação. “A rádio comunitária deve trabalhar junto ao Ministério Público, que é um dos instrumentos que podem fazer com que estes segmentos possam receber denúncias e investigar. A comunidade por si só não pode fazer um processo de justiça, mas ela pode caminhar junto com a justiça”, salientou.
Também esteve presente no debate, a jornalista e representante do Intervozes, Cecília Bezerra, que fez um panorama da comunicação atual a partir de espaços como a primeira Conferência Nacional de Comunicação e sua importância para a organização e sistematização do debate e pautas de reivindicação.
Organizado pelo Colegiado de Comunicação Social Jornalismo em Multimeios, do Departamento de Ciências Humanas (DCH III) da UNEB, em parceria com o Fórum de Comunicação do Sertão do São Francisco, o evento contou com a presença de estudantes e profissionais da área de Comunicação de toda a Região, bem como representantes de organizações independentes e movimentos sociais.
O debate continua hoje (19), a partir das 14h, com a discussão do tema “A comunicação no Sertão do São Francisco: O que temos e o que queremos”, que terá a participação de profissionais de comunicação da Região. Às 16h30, haverá uma homenagem a Dom José Rodrigues, por suas contribuições à comunicação no sertão do São Francisco.

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

O Brasil e a Política na Rede: Uma descoberta

Desde o ano de 2008, a internet passou a ser vista em todo mundo como uma potencial ferramenta de caráter político. A vitória de Barack Obama tornou-se uma referência no assunto, visto que o candidato conseguiu através das redes sociais quase metade do recurso utilizado na campanha.
No Brasil, algumas tentativas no mesmo sentido foram iniciadas nas eleições presidenciais em 2010, quando todos os candidatos experimentaram utilizar as redes para interagir com eleitor e saber de suas perspectivas. Diferente do presidente americano, aqui, os efeitos não foram tão perceptíveis e acredito que isso tenha ocorrido por conta de dois fatores: a falta de legislação eleitoral que discorra sobre a internet e a falta de acesso de toda população à rede.
 
Enquanto 85% dos americanos possuem internet em casa, apenas 33% dos brasileiros contam com a ferramenta para escolher seu candidato. Sendo assim, é compreensível que nos Estados Unidos o efeito da participação dos políticos nas redes sociais impactem mais no resultado da campanha e das eleições do que no Brasil. É a contradição tecnológica entre a votação de representantes políticos entre os dois países. Enquanto aqui sabemos o resultado no mesmo dia em que votamos, os americanos esperam dias pelo anúncio do vitorioso. Ao mesmo tempo, os Estados Unidos estão mais próximos da democratização política discutida por Pierre Levy. No Brasil, sites como o Transparência Brasil ainda dão os primeiros passos na participação política popular, por enquanto, ela se restringe à comentários politicamente correto nas redes sociais.
Outro aspecto que deve ser analisado é a falta de legislação clara no que diz respeito às regras da eleição na rede. Este fator inibe consideravelmente a participação política dos candidatos na internet. Nas eleições de 2012, o que pôde ser observado foi a grande discussão entre cidadãos comuns em seus perfis. Mesmo estes quando ofendidos, não sabiam a quem recorrer e a resposta vinha “na mesma moeda”. Apenas quando um funcionário público ou candidato decidia expor opinião política que opositores se preocupavam em conhecer, debater e fazer valer as regras eleitorais ainda tão novas. O medo de errar e ser incriminado neste caso, funcionou como agente inibidor da descoberta política na internet.
Sendo assim, mesmo que o Brasil cresça no número de pessoas com acesso à internet, ainda explora muito pouco as potencialidades da ferramenta que pode aproximar a política do cotidiano das pessoas. Além disso, as tecnologias utilizadas para agilidade na apuração dos votos já se consolidaram como modelo global, sendo assim, tecnologias para segurança dos usuários da internet deveriam ser implementadas inclusive nas redes sociais, para assegurar tranquilidade e eficácia no seu uso, elementos imprescindíveis para o avanço da política na rede. Além, é claro, de uma legislação clara no que diz respeito ao uso da internet para campanhas políticas.

sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Documentário “Nós que aqui estamos por vós esperamos”: Uma reflexão


A modernidade trouxe consigo uma série de características e valores, todos atrelados ao modelo econômico adotado pela maioria dos países do globo. O século XX foi um divisor de águas para implantação e entendimento deste modelo, já que contou com grandes revoluções capazes de modificar as lógicas social, política e econômica.


As alterações no modo de produção e consumo estão presentes em quase todas as ações exercidas no cotidiano. A lógica fordista, onde a linha de produção é dividida entre diversas pessoas com funções específicas, é perdurada até hoje no que diz respeito ao exercício do jornalismo. Em veículos como a televisão esta dinâmica se apresenta claramente, pois enquanto o produtor pensa e apura as pautas, o repórter faz entrevistas e escreve o texto, o cinegrafista capta imagens, o editor de texto o revisa, o editor de imagens as coloca na matéria, o editor monta o jornal e os apresentadores expõem suas imagens e trazem as matérias para os telespectadores. Tudo numa lógica definida, engessada, onde cada um sabe seu papel, sua tarefa, sem muito refletir sobre ela. Diferente do que o senso comum leva a crer, a atividade jornalística pouco reflete, pouco problematiza e muito mecaniza e reproduz.

Ainda assim, a falta de reflexão trazida pela modernidade para algumas profissões como o jornalismo, está longe de ser sua pior face. Os valores construídos na sociedade do mecanicismo - consumismo – globalizada são ainda mais graves para a formação cidadã. O individualismo e caracterização de alguns grupos como inferiores demonstra que esta lógica não existe para ser justa ou igualitária. O documentário “Nós que aqui estamos por vós esperamos” possui inúmeras frases e imagens de efeito que destacam esta lógica. Aqui destacarei as que mais me chamaram atenção: O trabalhador rural que não conhece energia elétrica, mas gosta de coca-cola, a mulher que conquistou sua independência financeira, mas assume ainda as atividades domésticas, bem como o jovem soldado que descreve sua rotina de guerra como uma espera por comida, água e só enxerga na morte a fuga desta angústia. 

Em todas as situações podemos destacar valores característicos do século que modificou toda ordem social. O jovem sem perspectiva, envolvido por um pseudo – patriotismo – mortífero propagado pela guerra demonstra que as vidas perdem importância para a disputa de poder. Da mesma forma, a mulher questionadora na sociedade patriarcal e machista tem a idéia de liberdade conquistada pelas lutas nos processos políticos, mas não consegue alcançar a tão sonhada sociedade igualitária, simplesmente porque foge aos interesses deste modelo. Outra desigualdade se destaca na imagem do trabalhador rural que sequer possui condições de vida digna com direito à energia, mas se deixa levar pela falsa ilusão de que todos nesta sociedade são iguais e por isso tem uma preferência por coca-cola, o maior símbolo da globalização proposta pelo capitalismo.

Assim, seja no trabalho como jornalista-mecanicista, na depressão feminina na luta pela igualdade, na preferência por coca-cola ou pela falta de oportunidade e perspectiva para os jovens, a modernidade me atinge, sem deixar opção de escolha. Além disso, nessa lógica da globalização e padronização de conceitos, hábitos e valores, não há como eu, ou qualquer outro cidadão fugir deste modelo. Da mesma forma, não há como evitar  que os que lá estão por nós esperem.